A Síndrome das Pernas Inquietas é uma das condições neurológicas crônicas mais comuns e surpreendentemente menos reportadas pela população adulta.
Dados de estudos clínicos estimam que cerca de 5 a 10% dos adultos sofrem ou já sofreram com a condição, que se caracteriza essencialmente por um desejo incontrolável de mexer as pernas em situações de repouso – ao deitar ou simplesmente estar sentado, notadamente ao final do dia e durante a noite, pouco antes de dormir ou na transição da vigília para o sono.
Este impulso é associado a um desconforto nas pernas, muitas vezes caracterizado como uma queimação, formigamento, coceira ou mesmo uma sensação desagradável difícil de descrever. Com o passar do tempo há uma tendência natural de ocorrerem micro despertares durante a noite, produzindo uma piora na arquitetura do sono, gerando insônia inicial ou intermediária, piora do humor, irritabilidade, falta de concentração e mesmo receio de ir para cama dormir (insônia psicofisiológica).
A hereditariedade parece ser importante no desenvolvimento da patologia. Há relatos frequentes de acometimento de mais um membro da família. Há ainda uma associação com transtornos mentais em boa parte dos pacientes acometidos. Muitos já sofrem cronicamente de ansiedade e outros transtornos do humor ou afeto, além de disfuncionalidades cognitivas como Transtorno de Déficit de Atenção.
Sabe-se também que há uma associação com outras desordens neurológicas como neuropatias periféricas (doenças que acometem os segmentos nervosos após sua saída ou emergência da medula espinhal), síndromes parkinsonianas, em especial a Doença de Parkinson e doenças sistêmicas como insuficiência renal crônica, anemia, situações que cursam hemorragias e perda de ferro.
O papel do ferro, aliás, apesar de não bem estabelecido, é relevante para o desenvolvimento da patologia. A carência de ferro parece produzir uma alteração estrutural bem definida ao nível de uma estrutura chamada Substantia Nigra, localizada em uma porção do cérebro chamada mesencéfalo, que desempenha um grande número de funções na regulação de estruturas nervosas cerebrais.
Apesar de seu diagnóstico ser essencialmente clínico, é possível corroborá-lo através da realização de exames de neuroimagem não invasivos. A ultrassonografia transcraniana, com avaliação das dimensões de estruturas localizadas no mesencéfalo, por exemplo, permite fazer a correlação entre diminuição de Substantia Nigra e Síndrome das Pernas Inquietas. Ou seja, na presença dos sintomas da síndrome, quanto menor a área da Substantia Nigra, maior a chance de se tratar realmente da condição.
O tratamento levará em conta o grau de desconforto do paciente e presença de comorbidades. Em geral, observa-se boa resposta clínica, com melhora dos sintomas a partir do uso em baixas doses de medicações como pramipexol, usado no tratamento da Doença de Parkinson ou mesmo o clonazepam.
A presença de comorbidades que cursem com carência de ferro pode também necessitar de abordagem terapêutica específica, assim como medidas de higiene do sono. Podem ser necessários ainda exames para melhor diagnóstico diferencial com neuropatias periféricas ou outras situações que promovam piora do sono. Exames de Ressonância Magnética, polissonografia e eletroneuromiogafia, portanto, podem fazer parte do rol de estudos para avaliação complementar.
Figura – Ultrassonografia Transcraniana com estudo de mesencéfalo: à esquerda observa-se diminuição de área de Substantia Nigra em paciente portador de Síndrome das Pernas Inquietas – área marcada em 2,em amarelo; à direita, estudo do mesencéfalo com medidas normais da Substantia Nigra.
Por: Dr. Marcus Vitor Oliveira – CRM/SC 12512 | RQE 8844.
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